O cenário tributário brasileiro está prestes a passar por uma importante transformação a partir de 2024. Em 19 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) proclamou o resultado do julgamento final dos embargos de declaração da Ação Direta de Constitucionalidade 49 (ADC 49), que tem como consequência a não-incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte. No entanto, essa mudança terá efeitos pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, com algumas ressalvas. Neste artigo, vamos analisar os principais pontos dessa decisão e as implicações que ela trará para o panorama fiscal brasileiro.
Transferência de ICMS
A transferência de ICMS é um processo pelo qual um contribuinte transfere a responsabilidade de recolher o imposto para outro contribuinte. Isso geralmente acontece quando uma mercadoria é movimentada entre estados. O ICMS é devido ao estado de origem da mercadoria, mas quando a mercadoria é destinada a outro estado, o ICMS deve ser transferido para o estado de destino. Esse processo é realizado por meio de um documento chamado de Guia Nacional de Recolhimento de Tributos Estaduais (GNRE) ou por meio de um convênio entre os estados, conhecido como Protocolo ICMS.
ICMS entre Unidades da Mesma Empresa
Quando uma empresa possui unidades em diferentes estados, é comum que haja a necessidade de transferir mercadorias entre essas unidades. Nesse caso, a empresa pode realizar a transferência de ICMS entre suas unidades. Isso significa que o ICMS devido na saída de uma unidade é transferido para a unidade de destino, de forma que o estado de destino receba o imposto devido. Essa transferência deve ser devidamente documentada e cumprir os requisitos fiscais estabelecidos pelos estados envolvidos.
Transferência de ICMS na Mesma Empresa
A transferência de ICMS na mesma empresa ocorre quando uma empresa transfere mercadorias ou serviços de uma parte para outra de seu próprio negócio. Isso pode ocorrer, por exemplo, entre filiais, departamentos ou centros de custos dentro da mesma empresa. Nesse caso, o ICMS deve ser calculado e registrado de acordo com as regras fiscais estabelecidas, e a empresa deve manter a documentação adequada para comprovar a transferência interna de mercadorias ou serviços.
ICMS Acumulado
O ICMS acumulado refere-se ao montante de ICMS que uma empresa deve pagar ou que tem a receber ao longo de um período de tempo. Esse acumulado pode ser tanto a pagar quanto a receber, dependendo das operações da empresa. Quando uma empresa vende mercadorias ou presta serviços, ela gera créditos de ICMS que podem ser utilizados para compensar o ICMS a pagar em operações futuras. O controle do ICMS acumulado é fundamental para a gestão financeira e tributária da empresa, garantindo que ela esteja em conformidade com suas obrigações fiscais.
Em resumo, o ICMS é um imposto estadual que envolve diversos aspectos, incluindo transferências entre estados, entre unidades da mesma empresa e dentro da própria empresa. Além disso, o controle do ICMS acumulado é essencial para a gestão financeira e tributária. Para garantir o cumprimento das obrigações fiscais e evitar problemas com a fiscalização, é fundamental que as empresas estejam bem informadas sobre esses conceitos e cumpram todas as regras e regulamentos estabelecidos pelos estados em que atuam.
A Decisão da ADC 49
A ADC 49, proclamada em 2021, reconheceu a não-incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte. Isso significa que o ICMS não será mais aplicado a esse tipo de operação a partir de 2024, desde que não haja débitos pendentes nos processos administrativos e judiciais até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito.
O STF reconheceu o direito de manutenção dos eventuais créditos existentes no estabelecimento remetente. A decisão ressaltou que o termo ‘operação’ se refere a atos mercantis de comercializar mercadorias, e a ‘circulação’ se relaciona a mudanças na titularidade da mercadoria. Portanto, em casos de mero deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, o fato gerador do ICMS não estaria configurado.
Desafios e Implicações
No entanto, essa mudança traz consigo uma série de desafios e implicações. Em primeiro lugar, é importante observar que o Congresso Nacional terá a responsabilidade de regulamentar esse tema até o início de 2024. Existem projetos de Lei Complementar nas duas casas legislativas para ajustar a Lei Kandir a essa nova perspectiva jurisprudencial. Um ponto crucial a ser abordado é o aproveitamento dos eventuais créditos existentes no estabelecimento remetente, uma questão que ainda não foi tratada em nenhum dos projetos em discussão.
A decisão também impacta a substituição tributária, que geralmente é cobrada na entrada dos estabelecimentos. As transferências entre estabelecimentos, que não se enquadram mais no conceito de “entradas”, podem gerar dúvidas quanto ao tratamento da substituição tributária e ao aproveitamento de créditos de etapas anteriores. É fundamental que o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) atue para ajustar o Convênio ICMS 142/2018 e a Lei Complementar 87/96, a fim de evitar distorções e questionamentos futuros.
Outra questão relevante é o impacto nas empresas que se beneficiam de créditos presumidos em transferências ou possuem diferimento nas aquisições e recebimentos. Essas empresas precisarão revisar suas estratégias fiscais para se adequar à nova realidade.
Em outras palavras, a decisão da ADC 49 do STF representa uma mudança significativa no cenário tributário brasileiro, com a não-incidência do ICMS nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte a partir de 2024. No entanto, as implicações e desafios decorrentes dessa decisão são complexos e exigirão ação tanto do Congresso Nacional quanto do CONFAZ para garantir a adequada regulamentação e ajustes no sistema tributário. É fundamental que empresas e profissionais da área fiscal estejam atentos a essas mudanças e busquem orientação especializada para navegar por esse novo cenário tributário brasileiro.